Roney Medeiros
Construir pontes significa que outros provavelmente pisarão sobre o fruto de nosso trabalho, que a nossa obra ficará exposta as intempéries e a condições extremas proporcionadas tanto pelo ambiente em que estiver inserida como artificialmente por ações de outros. Pontes feitas para durar exigem conhecimento do ambiente e estruturas sólidas para suportarem pesos e impactos além da sua capacidade nominal.
Estabelecer pontes significa não somente alcançar o espaco do outro, comunicar a “sua verdade” e influenciá-lo. Esta foi a abordagem proselitista que vigorou até a modernidade. Porém a dialética nos relembra que ao construirmos pontes teremos o nosso espaço invadido, sendo influenciados e permitindo que o outro também usufrua do nosso espaço.
Pontes são naturalmente uma via de mão dupla, porém para preservar o status quo criamos métodos artificiais para manter a ponte aberta somente em um único sentido transformando-a de elemento de desenvolvimento em elemento de exploração e dominação. Concretamente são placas, radares e pedágios e na prática são hierarquias, juros altos, acesso a educação, sistemas religiosos, etc.
Jesus construiu pontes com os samaritanos, com cobradores de impostos, com os excluídos e rejeitados rompendo com o sistema vigente em sua época. Mais que isto ele ofereceu seu próprio corpo como estrutura sólida para todos possam atravessar os abismos dos preconceitos e as mais diversas situações através da história.
É através desta ponte que Deus nos alcança em um mundo onde domina a carne o pecado e a injustiça, convidando-nos a sermos cidadãos do seu reino, compartilharmos de sua morada e vivermos uma nova realidade.
E não para por aí. No trecho conhecido como “Grande Comissão” Jesus nos ordena para anunciarmos as boas novas e fazermos discípulos. Na prática, somos convocados para mantermos a ponte aberta nos dois sentidos, voltando para o nosso antigo ambiente e ajudando a melhorar sua realidade.
Não se deve ter receio de cooperar com pensamentos, práticas ou religiões diferentes quando o resultado é em prol da sua criação, pois quando isto ocorre estamos cooperando com o propósito divino. Esquecemos que a cruz de Cristo fez parte do plano de Deus apesar de construída por seus algozes.
Porém, por maiores e robustas que sejam, pontes são caminhos estreitos que oferecem acessos limitados e suportam determinada capacidade. Assim como não é possível passar de um lado para outro com sua casa inteira, não é possível passar para o Reino de Deus com a nossa natureza caída, carregados de pecados. É preciso “aliviar a carga” e é isto que o perdão divino mediante sincero arrependimento faz.
A ponte que Jesus construiu tem um elemento de controle, um pedagio que ele pagou com seu sangue e pelo qual temos livre acesso a usufruir o reino de paz e justica que existe do outro lado.
Nesta época de pós-modernismo, onde está em voga o niilismo e a desconstrução, precisamos estarmos atentos para que, em prol de uma premissa apologética deficiente e eclesiologias sem sentido não estejamos restringindo o acesso dual de Deus para o mundo e do mundo para Deus, desconstruindo pelo desuso com o intuito de preservar a sólida estrutura que é a igreja de Cristo.
Nós como igreja, como corpo de Cristo temos obrigação de não somente “atravessarmos ” mas de “sermos” pontes edificadas por Deus. Não podemos ser pinguelas edificadas pelo tradicionalismo, ativismo, ideologias ou um pseudo-aviamento que muitas vezes se torna mais centrada na própria comunidade do que na Missio Dei.
Precisamos aceitar sermos pisoteados, termos disposição para sofrermos intempéries e suportarmos ataques como o próprio Jesus vivenciou. Precisamos interagir, e sermos influenciados pelo ambiente dos dois lados: santidade, paz, justiça, amor vs. a angustia pela falta disto tudo.