Afinal, trabalhar para quê? – Parte 1 from Fórum Cristão de Profissionais on Vimeo.
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Onde já se viu um judeu, descendente do rei Davi, reconhecido pelo povo como um Rabi, bebendo, indo a festas, conversando com imorais, curando no sábado, não jejuando, indo comer com os traidores da nação/religião… Que absurdo!!! Onde já se viu falar que um romano, adorador de outros deuses, um idólatra gentio teria mais fé que qualquer um de nós? Deveriam crucificá-lo e assim preservar a religião, não é mesmo?
E quanto a Paulo, defendendo que os gentios poderiam ser salvos e merecedores da graça sem ter que vir para a nossa religião? Já pensou no perigo ter alguém ser membro da comunidade sem ser circuncidado ou em nosso contexto: batizado “por imersão” (sic)?
Os religiosos da época devem ter se comportado do mesmo modo que muitos dos nossos contemporâneos quando estes veem a ousadia de alguns em sentar-se e compartilhar os pontos comuns com outras correntes da cristandade. Imagine então definir-se como “cristão missional, evangélico, pós-protestante, liberal-conservador, místico-poético, bíblico, carismático-contemplativo, fundamentalista, calvinista, anabatista-anglicano, metodista, católico, verde, encarnacional, deprimido-mas-esperançoso, emergente e inacabado” como faz Brian MacLaren?
Em geral, temos dificuldade de aceitar que Deus manifesta a sua graça nas outras tradições, além do nosso curral. Mas Jesus disse certa vez: Eu digo a vocês que, de fato, havia muitas viúvas em Israel no tempo do profeta Elias, quando não choveu durante três anos e meio, e houve uma grande fome em toda aquela terra. Porém Deus não enviou Elias a nenhuma das viúvas que viviam em Israel, mas somente a uma viúva que morava em Sarepta, perto de Sidom. Havia também muitos leprosos em Israel no tempo do profeta Eliseu, mas nenhum deles foi curado. Só Naamã, o sírio, foi curado. Quando ouviram isso, todos os que estavam na sinagoga ficaram com muita raiva.
Jesus foi um ecumenista de verdade… Não falo do ecumenismo romano, que tenta unir instituições sob o cuidado papal. Não do irenismo, fingindo que não existem diferenças relevantes entre instituições. Não do diálogo inter-religioso entre não cristãos.
Todos os itens acima estão relacionados a instituições religiosas e não a pessoas. Entretanto Jesus não veio fundar uma nova religião ou denominação. Não se vê Jesus fazendo nenhum tipo de proselitismo religioso.
O ecumenismo de verdade une PESSOAS (não instituições religiosas) À CRISTO (e não às igrejas). Portanto, me refiro ao tipo de ecumenismo que RECONCILIA A CRIACÃO COM O CRIADOR.
Já ouvi relatos de que nos países onde o cristianismo é perseguido as diferenças entre ICAR, Ortodoxos e Evangélicos fica em segundo plano. Por que será?
Ora, a Igreja real e espiritual se mostra UNA, CATOLICA e APOSTOLICA, se torna o Reino de Deus visível no mundo justamente quando se posiciona e atua demonstrando amor. Não quando afirma seus dogmas institucionalizados ou relativiza seus valores fundamentais. É esta a Igreja que atravessa milênios e estará com Cristo no céu.
Perceberam que nas últimas eleições presidenciais houve um movimento espontâneo de união da cristandade em prol de questões éticas e valores comuns? O mais interessante é que não surgiram do ecumenismo formal ou do intelectual/ideológico-libertário. Embora tentou-se posteriormente descaracterizar a espontaneidade do ocorrido e critique-se a sua usurpação por uma corrente política, o fato é que o secularismo ideológico não estava pronto para este tipo de golpe vindo de uma corrente neo-espiritualista em plena pós-modernidade através dos novos meios de comunicação social. Ou seja, presenciamos um verdadeiro “netweaving da moral cristã”, uma verdadeira ação ecumênica em defesa da vida para o qual os atores tradicionais não estavam preparados para interpretá-la.
Segundo John Stott, “se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos manter a verdade em amor, não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade” (…)
Finalizando, o ecumenista legítimo crê que “AQUELE (e não aquilo) que nos une é maior que AQUILO que nos separa”. Percebe? Trata-se de vida e não religião. Aproveitando fica a dica para refletir na assinatura eletrônica de uma “colega listeira” Westh Ney: “No essencial – unidade; nas diferenças – liberdade; e em todas as coisas – o amor.” (teólogo Peter Meiderlin)
Notas
Ecumenismo na visão da ICAR – Igreja Católica Apostólica Romana, é o movimento de união das igrejas sob o apostolado de Pedro (Roma). Eles crêem que existe salvação nas outras igrejas cristãs, mas que a completa e sã doutrina é a romana.
Irenismo é a espécie de ecumenismo que defende a união de pontos comuns, esquecendo-se e subtraindo-se o que divide as religiões e a verdade de cada uma. A ICAR defende o tipo anterior e, portanto nega veementemente o irenismo.
Os primeiros concílios da igreja são chamados ecumênicos porque são aceitos por toda a cristandade.
O dialogo inter-religioso não é ecumenismo, pois o ecumenismo só existe entre cristãos. Ele visa à aproximação e ações conjuntas entre todas as religiões apenas no que se refere ao bem comum e ao homem.
Será que finalmente a Igreja Emergente está emergindo no Brasil?
Publicado: 11/08/2010 em Diálogo, Espiritualidade, ReligiãoTags:eclesiologia, Espiritualidade, igreja emergente
Os novos evangélicos e a nova reforma protestante
Trecho de "Os Novos Evangélicos" – Revista Época
Por Ricardo Alexandre.
Inspirado no cristianismo primitivo e conectado à internet, um grupo crescente de religiosos critica a corrupção neopentecostal e tenta recriar o protestantismo à brasileira.
Irani Rosique não é apóstolo, bispo, presbítero nem pastor. É apenas um cirurgião geral de 49 anos em Ariquemes, cidade de 80 mil habitantes do interior de Rondônia. No alpendre da casa de uma amiga professora, ele se prepara para falar. Cercado por conhecidos, vizinhos e parentes da anfitriã, por 15 minutos Rosique conversa sobre o salmo primeiro (“Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios”). Depois, o grupo de umas 15 pessoas ora pela última vez – como já havia orado e cantado por cerca de meia hora antes – e então parte para o tradicional chá com bolachas, regado a conversa animada e íntima.
Desde que se converteu ao cristianismo evangélico, durante uma aula de inglês em Goiânia em 1969, Rosique pratica sua fé assim, em pequenos grupos de oração, comunhão e estudo da Bíblia. Com o passar do tempo, esses grupos cresceram e se multiplicaram. Hoje, são 262 espalhados por Ariquemes, reunindo cerca de 2.500 pessoas, organizadas por 11 “supervisores”, Rosique entre eles. São professores, médicos, enfermeiros, pecuaristas, nutricionistas, com uma única característica comum: são crentes mais experientes.
O cirurgião Irani Rosique (sentado, de camisa branca, com a Bíblia aberta no colo). Sem cargo de clérigo, ele mobiliza 2.500 pessoas no interior de Rondônia.
Apesar de jamais ter participado de uma igreja nos moldes tradicionais, Rosique é hoje uma referência entre líderes religiosos de todo o Brasil, mesmo os mais tradicionais. Recebe convites para falar sobre sua visão descomplicada de comunidade cristã, vindos de igrejas que há 20 anos não lhe responderiam um telefonema. Ele pode ser visto como um “símbolo” do período de transição que a igreja evangélica brasileira atravessa. Um tempo em que ritos, doutrinas, tradições, dogmas, jargões e hierarquias estão sob profundo processo de revisão, apontando para uma relação com o Divino muito diferente daquela divulgada nos horários pagos da TV.
Estima-se que haja cerca de 46 milhões de evangélicos no Brasil. Seu crescimento foi seis vezes maior do que a população total desde 1960, quando havia menos de 3 milhões de fiéis espalhados principalmente entre as igrejas conhecidas como históricas (batistas, luteranos, presbiterianos e metodistas). Na década de 1960, a hegemonia passou para as mãos dos pentecostais, que davam ênfase em curas e milagres nos cultos de igrejas como Assembleia de Deus, Congregação Cristã no Brasil e O Brasil Para Cristo. A grande explosão numérica evangélica deu-se na década de 1980, com o surgimento das denominações neopentecostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus e a Renascer. Elas tiraram do pentecostalismo a rigidez de costumes e a ele adicionaram a “teologia da prosperidade”. Há quem aposte que até 2020 metade dos brasileiros professará à fé evangélica.
Fonte: Revista Época.
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Observação: neste blog você encontra um bom material e links sobre Igreja Emergente.
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Nota retirada de http://paoevinho.org/?p=5459
Mais uma vez comprova-se que o fenômeno do cristianismo simples está crescendo e cada vez mais chamando a atenção tanto da Igreja institucional quanto da mídia secular . Mas não penso que o cristianismo simples ao qual a reportagem se refere seja a “recriação do Protestantismo à brasileira.” Este não é um fenômeno exclusivamente tupiniquim, muito embora o potencial de crescimento da Igreja nos lares no Brasil seja imensamente maior do que em muitos países – o que ocorre também na Igreja institucional.
O artigo está muito bem escrito, levando-se em consideração que provavelmente saiu da pena de um jornalista secular. Mas o autor comete algumas generalizações a começar pelo fato de dizer que todo cristão não-católico no Brasil é evangélico (ver quadro acima). Mormons e Testemunhas de Jeová não se consideram e não são considerados evangélicos.
Ao ler o artigo completo (o que vemos acima é somente um trecho), vemos que o autor cita três correntes, sem se preocupar em diferenciá-las. A primeira, é a Igreja nos lares, a segunda é a Igreja emergente e a terceira é a dos blogueiros apologistas. Ele converge estas três correntes em um movimento de reação contra as exuberâncias do neopentecostalismo.
Mas a Igreja emergente, por exemplo, não se trata de uma reação ao neopentecostalismo. A Igreja emergente entende que a Igreja moderna, em geral, necessita de uma reforma e tem como enfoque construir pontes entre a Igreja e a geração pós-moderna. E apesar de a “desinstitucionalização” ser parte da pauta do diálogo emergente, muitas das comunidades emergentes são institucionais.
O artigo menciona os chamados blogueiros apologistas entre os novos reformadores, mas eles em sua maioria são somente irmãos conservadores de orientação reformada que não estão de acordo com os abusos das igrejas neopentecostais. Eles acertadamente clamam pelo regresso a uma sã doutrina, mas isso não necessariamente faz deles cristãos emergentes ou novos evangélicos.
Embora o neopentecostalismo seja a “vidraça” da vez, a Igreja nos lares tampouco é uma reação ao neopentecostalismo especificamente e sim uma alternativa ao sistema institucional de forma generalizada.
Diálogo interreligioso: o que eu tenho com isso?
Publicado: 09/07/2010 em Diálogo, Espiritualidade, ReligiãoTags:Diálogo, Religião
Jorge Camargo
Em se tratando de teologia, eu me sinto como o Belchior, célebre compositor cearense em um de seus clássicos, “Apenas um Rapaz Latino-Americano”: “Por favor, não saque a arma no saloon: eu sou apenas o cantor!”.
Ocorre que eu vivo num mundo interconectado, integrado, multiplural. E, acima de tudo, como ser humano sou livre para expressar meus pensamentos e sentimentos relacionados à vida, a Deus e ao próximo. E a partir disso, concluo: a hegemonia política do cristianismo é passado.
A força de sua mensagem, pra mim, permanece intocável. Amor sem medida, misericórdia, compaixão, generosidade, fome e sede de justiça. Em se tratando de instituição religiosa, no entanto, há muito os representantes oficiais da fé cristã têm perdido credibilidade e relevância. E nós muitas vezes confundimos Cristo com cristianismo, o que se trata de um pecado quase imperdoável.
Thomas Merton (1915-1968), sobre quem escrevi em meu livro “Somos Um”, foi um monge católico que bebeu na fonte da mística cristã em São João da Cruz e que no fim da vida promoveu o diálogo interreligioso com monges tibetanos, não para renegar sua fé, mas entendendo que sua herança cristã de dois milênios e o que ele não tinha a pretensão de conhecer por completo no tempo de uma única existência, poderiam beneficiar-se do diálogo com outra herança igualmente rica, uma vez que Deus não é cristão, kardecista, muçulmano, adepto das religiões afro, hindu, e a grandeza de seu mistério é simplesmente insondável.
Eu tenho a nítida sensação e a firme convicção de que o futuro da fé e a força da mensagem cristã passam por uma atitude de abertura ao diferente, uma postura de abnegação e de serviço ao outro, seja este quem for.
Ainda sonho com um mundo melhor. E um mundo melhor significa diálogo.
“Mas se depois de cantar
Você ainda quiser me atirar
Mate-me logo
À tarde, às três
Que à noite eu
Tenho um compromisso
E não posso faltar…”
• Jorge Camargo, mestre em ciências da religião, é intérprete, compositor, músico, poeta e tradutor. www.jorgecamargo.com.br
Quero uma igreja nova
Publicado: 22/05/2010 em Diálogo, Espiritualidade, ReligiãoTags:cristianismo, eclesiologia, Igreja
Roney Medeiros
O que falta aos modelos de crescimento de Igreja? Proporcionar crescimento fora de suas portas…
O que falta para a Igreja emergente? Emergir do discurso para a práxis…
O que falta para a teologia da libertação? Libertar-se do marxismo e da ideologia travestida de teologia…
O que falta para a missão integral? Engajamento integral da igreja na causa missional…
O que falta para as igrejas históricas? Vida, entusiasmo, abertura para ser “reformada e sempre reformando”. Por sua vez, O que falta para as igrejas “avivadas”? Compromisso com a sua história. O que elas têm em comum? Fundamentalismo e falta de abertura à crítica.
Diante deste cenário o que nos resta? Nostalgia, lamentar o presente ou caminhar ao futuro?
Ah… Como seria uma igreja capaz de dialogar e atuar no mundo sem medo de ser afetado, contaminado ou confundido com ele?
Ah… Como seria uma igreja que interagisse no campo prático, cooperando com Deus em ações libertárias tanto nas relações de poder, econômicas e sociais como também no plano espiritual?
Ah… Como seria uma igreja cuja atuação no mundo não objetivasse um proselitismo oculto, mas o estabelecimento do Reino de Paz no mundo?
Ah… Como seria uma igreja propositiva, propondo questões antes não colocadas e levando esperança a sociedade ao invés de ficar defendendo seus dogmas e respondendo questões que já saíram da pauta?
Ah… Como seria uma igreja que depositasse sua fé nas escrituras e não em uma interpretação das escrituras, que não tenha receio e não demonize o questionamento (interno ou externo) de sua fé? Que admita que para muitas questões as respostas são possibilidades de fé que jamais serão provadas?
Ah… Como seria uma igreja que não fosse Igreja, mas uma “outra coisa” que não pudesse ser confundida com instituição? Talvez devêssemos ousar não ser mais que um movimento, pois “ek klesia” é mais um movimento que ajuntamento.
Ah… Como seria se este movimento estivesse disposto a fazer de seus relacionamentos sua liturgia, do diálogo sua homilética e da cooperação sua práxis?
Ah… Como seria se Deus pudesse ser percebido nas relações sociais, familiares? Nas relações igreja com o mundo e com os seus (pois já disseram que a igreja é o único exército que abandona seus feridos)? Afinal, Deus também se utiliza das relações como instrumento de sua revelação.
Corpo é unidade, é interdependente. Corpo tem comando, atende ao chamado do cabeça (sic). Corpo tem vida, corpo é movimento e esse movimento é interno e externo. Corpo existe no mundo e sua atuação gera e sofre impacto direto e indireto, no presente e no futuro.
Quero uma igreja nova, que não seja instituição mais que corpo. Um corpo vivo e não morto. Quero um movimento e não algo estático.
Nota: este artigo foi inspirado nos artigos “Quero uma igreja velha” e “Quero um culto velho” do Pr. Isaltino Gomes e não pretende ou deve ser confundido como uma resposta ou qualquer tipo de crítica.
Intangibilidade e Imprevisibilidade
Publicado: 29/03/2010 em Diálogo, EspiritualidadeTags:Espiritualidade, mecânica quântica, pós-modernidade
Roney Medeiros
Cansei do discurso proclamado pelos gurus da auto-ajuda, da média gerência das empresas e daquele pessoal de desenvolvimento de RH’s. Também já estou cansado de apologéticos da teologia da prosperidade, palavra da fé, etc. São duas perspectivas do mesmo blá, blá, blá.
Estes discursos ignoram completamente os conceitos de física quântica, fecham os olhos propositadamente para realidade do mundo ao seu redor e para os eventos de sua própria história quanto a imprevisibilidade. “Seja o protagonista de sua vida” anuncia um treinamento. “Você mereceu”, diz a campanha publicitária de um carro de alto padrão. “Tudo é possível para aquele que crê”, desde que cumpram determinado ritual de algumas semanas, sejam fiéis nas campanhas e outras coisas.
Seja na vida “secular/profissional” ou “espiritual”, o seu “sucesso” só depende de você! Ele está em suas mãos! Se existem pobres, miséria e injustiça social isto ocorre devido a falta de garra, a preguiça e na indisciplina na busca pelo sucesso através dos meios consagrados pelo secularismo (estudo, iniciativa, trabalho árduo) ou por uma espiritualidade vazia (“fé nas promessas de sucesso”, campanhas e é claro, semear muitas ofertas além dízimo). Limitam-se a mensagens triunfalistas: “Você já venceu!”, “Eu profetizo vitória…!”, “Você é filho do rei; não pode ser pobre”; “Declare, determine, decrete…”; “agradeça antecipadamente, como se já tivesse alcançado e bêncão”.
Não se permitem questionar os pressupostos, não admitem a possibilidade de estarem enganados pois qualquer elemento de dúvida quebraria o “feitiço” da confissão positiva. Sim, feitiço porque evangelho isto não é! Se o universo de possibilidades pode ser restrito pelo observador, ignoram que devido as condições históricas, as influências do meio, do comportamental, das experiências individuais, das influências do mundo espiritual e das decisões e observações de outros em todos os tempos, levam a uma condição de total imprevisibilidade e intangibilidade. Quanto cada fator, cada decisão contribuiu para sermos o que somos hoje e o que seremos amanhã? Para este pessoal que gosta de fórmulas prontas, assistir a um filme “Efeito Borboleta” não como entretenimento, mas para repensar seus conceitos é exigir demais.
Outra linha de gurus empresariais, porém mais místicos, dirão que o universo conspira a nosso favor. Porém esta falácia não explica como uma “força” ou “energia” impessoal pode conspirar por algo, pois para isto deveria haver um mínimo de inteligência/pessoalidade superior, o que fatalmente levaria a considerar Deus como uma possibilidade real. Pior ainda é que existem “gurus espirituais da prosperidade” nesta linha, que assumindo a existência de Deus propagam a mesma falácia de conspiração divina através de alguns textos bíblicos selecionados, como: Salmo 37:25, Salmo 91:07 e Romanos 8:28, II Corintios 9:6, Filipenses 4:13 para expor suas idéias de livramento das dificuldades e sucesso material. Estranho que ninguém se lembre de como Jesus, os apóstolos e os discípulos das igreja primitiva viveram e morreram. Com certeza não era deste tipo de sucesso (material e boa vida) que eles tiveram. Se quiserem ver servos fiéis passando dificuldades, visitem uma favela ou alguns missionários que mais do que dinheiro estão dando suas vidas.
Voltando para imprevisibilidade, algumas empresas no setor de serviços, pesquisa e desenvolvimento e outros segmentos já perceberam a imprevisibilidade. Negam, mas na prática não trabalham com um “roadmap de produtos” mas com mapas de tendências, possibilidades e capacidades, de onde podem “sacar” um produto a qualquer momento dependendo da variação do mercado, concorrência, economia. Peça para algum executivo de marketing dimensionar o volume, aceitação e retorno de um destes produtos novos e inovadores para se ter noção da intangibilidade que nos rodeia. Ouvi certa vez de um executivo que “Business Plan é uma mentira que todos concordam em acreditar”. Ou seja, intangibilidade e imprevisibilidade.
Também é isto que temos no plano pessoal e espiritual: possibilidades! Criadas a partir de nossas escolhas sim, mas também pelas escolhas de outros, influenciados pelo meio, historia, crenças e valores, além do mundo espiritual. Sempre teremos possibilidades de escolha certas ou erradas, de arrependimento e de perdão, de seguir a uma fé ou não, de termos uma atitude ativa ou passiva. Nunca saberemos a amplitude e abrangência destas possibilidades em nossa existência, na existência do outro e na própria existência do planeta. Imprevisibilidade e Intangibilidade estão ligadas.
Mas a vida se resume apenas a isto? Acidentes? Felizmente não. Embora estejamos presos a três dimensões do espaço e a meia dimensão de tempo, isto não significa que não haja um ser pessoal e inteligente que consiga atuar no mundo além destas dimensões e interagindo com elas.
A Bíblia diz no poema da criação de Gênesis que tudo, inclusive as dimensões de tempo e espaço foram criadas por Deus. Logo, Ele não pode ser contido nas mesmas, porém pode interagir com elas.
É neste ponto que imprevisibilidade e intangibilidade perdem seu domínio, pois diante deste ser, Deus, todo o mapa de possibilidades se encontra aberto de forma presente e atemporal todas as nossas possibilidades de escolhas e decisões e como elas afetam a Sua criação. |
Aqui talvez resida a onisciência de Deus e sua manipulação da história visando cumprir seus planos. Em outras palavras, a Sua vontade permissiva, diretiva e ativa.
Neste ponto, a existência de Cristo, seu nascimento, vida e morte, sua união hipostática com o Criador é a maior expressão desta intervenção divina. Uma intervenção que atravessa as dimensões de espaço e tempo, uma intervenção que afeta a realidade física e espiritual. Uma intervenção que dependeu da vontade humana de Jesus em obedecer ao Pai.
Isto não significa que Deus esteja obrigado a agir de tal maneira em todas as situações corriqueiras da nossa vida, embora Ele o faça sempre que desejar. Mas também não significa que não estejamos sob a guarda de um ser poderoso, que tem em suas mãos o destino de toda a criação e que se importa com a mesma. Não se trata de uma força cósmica, uma energia impessoal.
Praticamente toda a Bíblia é um relato de experiências de como pessoas comuns reconheceram a ação sobrenatural (ou sobre-dimensional) de Deus em suas vidas. Perceberam o “toque” deste Deus ao mesmo tempo imanente e transcendente em suas histórias. Não são fatos científicos, mas relatos de fé, de espiritualidade genuína que mudaram a vida de milhões em diferentes épocas.
Claro que os escritores não tinham idéia que seus relatos, transmitidos de forma oral e posteriormente de forma escrita afetaria a história até hoje. Acima de tudo, são relatos por onde Deus se deixa perceber aos outros e são aplicados de diversas formas e contextos devido a polissemia dos textos Mais uma vez Imprevisibilidade e Intangibilidade se mostram como uma realidade para nós, seres naturais podem ser conduzidas por Deus.
Dito tudo isto, então como deveremos viver?
Bem, primeiro não fique tão preocupado com esta história de que você deve dominar todas as situações ao seu redor para criar uma nova realidade ou se martirizar por pelo que você poderia ter sido ou tido. Você não tem o controle ou mesmo ciência de todas as variantes envolvidas;
Em segundo, utilize todas as oportunidades para crescer, refletindo sobre suas atitudes e decisões. Não tenha medo de se arrepender, pois o aprendizado, o perdão e a cura nascem de arrependimento. Não se negue a visitar o passado, mas também não viva em função dele. Lembre-se que a meia-dimensão de tempo em que vivemos é destinada ao futuro.
Terceiro, lembre-se que você é um ser cujas ações e decisões tem impacto em toda a criação. Estamos todos conectados de alguma forma, portanto seja fiel a Deus, faça escolhas certas, aja de acordo com seus valores, faça sua vida valer a pena. A revelação de Deus está completa em Jesus Cristo, mas o cânon ainda está aberto, sendo escrito pelo Espírito Santo em nossas vidas. Permita-se fazer parte desta história, não resista ao Espírito de Deus.
E por último, nos dias maus revista-se de Deus (Efésios 6:13-24), não se esquecendo da Sua misericórdia e soberania. Embora Ele não esteja obrigado a agir em todas as situações, suas intervenções e livramentos são mais freqüentes do que imagina a nossa sociedade secularizada. E em muitas, talvez em sua grande maioria sequer são percebidas pelos eleitos de Deus.
Sejamos Pontes
Publicado: 17/03/2010 em Diálogo, Espiritualidade, ReligiãoTags:Espiritualidade, missão
Roney Medeiros
Construir pontes significa que outros provavelmente pisarão sobre o fruto de nosso trabalho, que a nossa obra ficará exposta as intempéries e a condições extremas proporcionadas tanto pelo ambiente em que estiver inserida como artificialmente por ações de outros. Pontes feitas para durar exigem conhecimento do ambiente e estruturas sólidas para suportarem pesos e impactos além da sua capacidade nominal.
Estabelecer pontes significa não somente alcançar o espaco do outro, comunicar a “sua verdade” e influenciá-lo. Esta foi a abordagem proselitista que vigorou até a modernidade. Porém a dialética nos relembra que ao construirmos pontes teremos o nosso espaço invadido, sendo influenciados e permitindo que o outro também usufrua do nosso espaço.
Pontes são naturalmente uma via de mão dupla, porém para preservar o status quo criamos métodos artificiais para manter a ponte aberta somente em um único sentido transformando-a de elemento de desenvolvimento em elemento de exploração e dominação. Concretamente são placas, radares e pedágios e na prática são hierarquias, juros altos, acesso a educação, sistemas religiosos, etc.
Jesus construiu pontes com os samaritanos, com cobradores de impostos, com os excluídos e rejeitados rompendo com o sistema vigente em sua época. Mais que isto ele ofereceu seu próprio corpo como estrutura sólida para todos possam atravessar os abismos dos preconceitos e as mais diversas situações através da história.
É através desta ponte que Deus nos alcança em um mundo onde domina a carne o pecado e a injustiça, convidando-nos a sermos cidadãos do seu reino, compartilharmos de sua morada e vivermos uma nova realidade.
E não para por aí. No trecho conhecido como “Grande Comissão” Jesus nos ordena para anunciarmos as boas novas e fazermos discípulos. Na prática, somos convocados para mantermos a ponte aberta nos dois sentidos, voltando para o nosso antigo ambiente e ajudando a melhorar sua realidade.
Não se deve ter receio de cooperar com pensamentos, práticas ou religiões diferentes quando o resultado é em prol da sua criação, pois quando isto ocorre estamos cooperando com o propósito divino. Esquecemos que a cruz de Cristo fez parte do plano de Deus apesar de construída por seus algozes.
Porém, por maiores e robustas que sejam, pontes são caminhos estreitos que oferecem acessos limitados e suportam determinada capacidade. Assim como não é possível passar de um lado para outro com sua casa inteira, não é possível passar para o Reino de Deus com a nossa natureza caída, carregados de pecados. É preciso “aliviar a carga” e é isto que o perdão divino mediante sincero arrependimento faz.
A ponte que Jesus construiu tem um elemento de controle, um pedagio que ele pagou com seu sangue e pelo qual temos livre acesso a usufruir o reino de paz e justica que existe do outro lado.
Nesta época de pós-modernismo, onde está em voga o niilismo e a desconstrução, precisamos estarmos atentos para que, em prol de uma premissa apologética deficiente e eclesiologias sem sentido não estejamos restringindo o acesso dual de Deus para o mundo e do mundo para Deus, desconstruindo pelo desuso com o intuito de preservar a sólida estrutura que é a igreja de Cristo.
Nós como igreja, como corpo de Cristo temos obrigação de não somente “atravessarmos ” mas de “sermos” pontes edificadas por Deus. Não podemos ser pinguelas edificadas pelo tradicionalismo, ativismo, ideologias ou um pseudo-aviamento que muitas vezes se torna mais centrada na própria comunidade do que na Missio Dei.
Precisamos aceitar sermos pisoteados, termos disposição para sofrermos intempéries e suportarmos ataques como o próprio Jesus vivenciou. Precisamos interagir, e sermos influenciados pelo ambiente dos dois lados: santidade, paz, justiça, amor vs. a angustia pela falta disto tudo.
Eclesiologia Cooperativista – a Igreja 2.0
Publicado: 06/12/2008 em Diálogo, ReligiãoTags:cooperativismo, eclesiologia, pós-modernidade
As possíveis causas desta realidade são diversas, mas relaciona-se principalmente com o sentimento de pós-modernidade que se apresenta.
Embora o sistema congregacional/batista seja também em essência cooperativista, temos visto alguns movimentos em prol de um controle denominacional sobre a igreja local, inclusive pressão para que igrejas firmem em seus estatutos cláusulas pétrias em que seus bens são automaticamente assumidos pela denominação em caso de dissidência ou discordância futura da congregação com a denominação.
Ora, este tipo de pressão nada mais é do que uma falta de visão sobre a mudança de pensamento pela qual estamos passando. Igreja é a comunidade local que partilha da mesma fé. Cláusulas como esta não evitarão divisões e nem irão gerar subserviência.
As denominações enquanto instituições vão sofrer se não se adaptarem ao dinamismo do momento. A experiência da comunhão, da participação comunitária mudou e agora ocorre em tempo real. Ao contrário do que se pensa, aquele jovem não está “sozinho na frente do computador”, mas está se relacionando e cooperando com muitos outros simultâneamente através do mundo virtual, vide exemplos das redes sociais e de iniciativas open source.
Por isto defendemos a criação de um novo sistema de governo eclesiástico, o Sistema Cooperativista, que tira da “informalidade” e torna transparentes as associações das igrejas com suas denominações e com os movimentos para-eclesiásticos estabelecidos. Como internamente as igrejas locais estruturariam o poder, isto poderia ser resolvido dentro da própria igreja.
Uma eclesiologia cooperativista assume uma função dialética importante. A igreja passa a dialogar não somente com sua denominação ou com igrejas com a “mesma visão”, mas dialoga e coopera em prol do ser humano com a sociedade como um todo, ficando livre para cooperar com diversas entidades, associações, iniciativa privada, governo e até outras confissões religiosas.
A idéia de igreja 2.0 não é uma igreja hi-tech, mas é uma igreja que se adequa ao pensamento pós-moderno, que sabe se relacionar e investe em relacionamentos e na participação comunitária.
Através de uma eclesiologia cooperativista, o Missio Dei é atingido mais facilmente, pois rompem-se as barreiras denominacionais e visionárias (baseadas em modelos de crescimento). Através da cooperação, a igreja pode tornar-se de uma forma mais viável uma comunidade que atenda o indivíduo de maneira integral, pois dialoga ao mesmo tempo com o sistema econômico estabelecido e com a necessidade de libertação do ser humano. Uma teologia cooperativista seria uma proposta alternativa à teologia da prosperidade, baseada no capitalismo/neoliberalismo e à teologia da libertação, influenciada pelo socialismo. Em uma leitura cooperativista, Deus se revela através da cooperação entre Ele e seus filhos, e também entre seus filhos.
Concluímos co-citando Stott[1].
[1] Citação de Stott realizada por Antonio José do Nascimento Filho, em seu artigo “Construindo nossa Percepção e Leitura Histórica da América Latina e Seus Problemas – Mackenzie – Fides Reformata Vol. 6/1 (2001)